Estado já ordenou 535 mil hectares de territórios de pesca com 9 acordos já regulamentados. Até agora, mais de 14 mil famílias foram beneficiadas
05/09/2024 17h00 | Atualizado em 06/09/2024 13h57 Por ASCOM
Desde 2021, quando entrou em vigor o Decreto Estadual nº 1.686, que define as regras dos acordos de pesca no Estado, o Pará já realizou o ordenamento de 535 mil hectares de territórios de pesca com 9 acordos já regulamentados para a prática da pesca artesanal. Até agora, 240 comunidades foram beneficiadas, envolvendo 14,1 mil famílias.
Desta forma, o Governo do Estado recupera em sua atual gestão o tempo perdido após um atraso de dez anos na implementação de uma política de ordenamento da pesca artesanal. Em 2011, o Governo Federal transferiu a gestão do ordenamento de pesca para os Estados, gerando expectativa por parte das comunidades ribeirinhas para que o Pará implantasse uma política pública para proteger os recursos naturais e garantir a sustentabilidade da pesca artesanal, essencial para a subsistência de milhares de famílias.
De acordo com informações da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semas), que coordena a política de ordenamento pesqueiro no Estado, outros 16 acordos de pesca estão sendo construídos com as comunidades ribeirinhas.
“A edição desse decreto trouxe uma nova esperança para os ribeirinhos, que precisam desse recurso para a sua sobrevivência e também para defender os seus territórios pesqueiros”, afirma Wandicleia Lopes, coordenadora da Sociedade para a Pesquisa e Proteção do Meio Ambiente (Sapopema), uma das entidades parceiras da Semas na elaboração dos acordos.
A resposta das comunidades foi imediata. A partir da publicação do decreto, elas começaram a se mobilizar para revisar suas normas internas, muitas das quais estavam desatualizadas e precisavam de ajustes para proteger os recursos pesqueiros locais. “Todas as comunidades começaram a se mobilizar para fazer a revisão das suas normas, que já estavam defasadas e precisando de uma atualização”, diz Wandicleia Lopes.
O decreto estabelece regras claras para a atividade pesqueira no Estado, envolvendo as comunidades tradicionais na definição dessas normas. Sob a coordenação da Semas, o processo de criação e homologação dos acordos de pesca tem sido realizado de forma colaborativa, em um modelo de cogestão que atende às especificidades locais. “Este decreto é um divisor de águas para a legislação estadual e, em especial, para as comunidades tradicionais e pescadores artesanais. Havia um anseio muito grande para que o Estado pudesse assumir o ordenamento pesqueiro”, continua a coordenadora.
Gestão compartilhada – O processo participativo na elaboração dos acordos conta com o envolvimento direto de associações de pescadores, lideranças comunitárias e institutos de pesquisa, que oferecem suporte científico e ajudam a integrar o conhecimento tradicional às diretrizes técnicas estabelecidas pela Semas.
“A atuação da Semas na política pesqueira tem sido um processo de cogestão, uma gestão compartilhada, e isso tem dado às comunidades a possibilidade de também construir suas normas a partir de sua concepção das necessidades de suas comunidades”, explica a coordenadora. “E quando a Semas formaliza, homologa um acordo que foi construído comunitariamente a partir de todos passos do decreto, ela está dando legitimidade para essas comunidades continuarem defendendo o seu acordo”, afirma Wandicleia Lopes.
“Durante o mapeamento e revisão dos acordos, os pescadores artesanais têm um papel central na identificação de áreas com potencial para manejo, zonas com recursos disponíveis e regiões degradadas ou sob pressão. Este conhecimento local é vital para a criação de regras eficazes e sustentáveis, pois complementa o trabalho científico das equipes técnicas”, diz a coordenadora. “Quando a equipe técnica da Sapopema localiza o ponto de referência (da região a ser beneficiada pelo acordo), vemos a importância dessa junção do conhecimento tradicional com o conhecimento científico para definição das regras do acordo”, complementa.
“A autogestão participativa da pesca comunitária se apresenta como um caminho viável tanto para a preservação ambiental quanto para assegurar um futuro sustentável para a pesca na região”, informa o secretário adjunto de Gestão e Regularidade Ambiental da Semas, Rodolpho Zahluth Bastos.
A homologação dos acordos é baseada em legislações e normativas estaduais e federais. Além do Decreto nº 1.686, a Instrução Normativa nº 02, de 2022, estabelece os procedimentos para homologação de acordos de pesca, no âmbito da Semas. As tratativas refletem ainda os processos participativos comunitários previstos na Convenção n°169, da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Ordenamento pesqueiro – Entre as principais dificuldades enfrentadas pelos ribeirinhos para conseguir pescar está a atividade de embarcações pesqueiras de grande porte, que capturam grande quantidade de peixes e deixam as comunidades sem a sua principal fonte de alimentação.
“Os pescadores e pescadoras artesanais têm um histórico de luta pela conservação dos recursos pesqueiros. Eles desempenham papel fundamental ao garantir que esses recursos sejam utilizados de maneira sustentável. Essa luta ocorre devido à pressão intensa sobre os recursos pesqueiros, por parte de grandes barcos pesqueiros que invadem áreas de comunidades tradicionais para capturar peixes destinados à comercialização”, declara a representante da Sapopema.
“Esses barcos utilizam técnicas predatórias, como a pesca de arrasto, que não só esgotam os estoques pesqueiros, mas também causam degradação e desequilíbrio ambiental”, explica a coordenadora.
“Além de dirimir conflitos de uso, as regras de manejo acordadas apoiam o ordenamento comunitário dos territórios de pesca, atentam para a necessidade de proteger as áreas de reprodução e matas ciliares, definem períodos de fechamento de pesca mais adequados à realidade local, evitando assim o declínio da produtividade pesqueira”, afirma Fernanda Henriques, técnica da Gerência de Fauna, Pesca e Aquicultura (Gefap) da Semas.
A Semas destaca que a homologação dos acordos é apenas uma etapa do processo, sendo igualmente importante o monitoramento contínuo e a fiscalização das atividades pesqueiras para assegurar o cumprimento das regras estabelecidas.
Pós-acordo – “Após a homologação dos acordos, a Semas coordena a fase seguinte, desenvolvendo estratégias colaborativas e somando esforços coletivos para garantir a efetividade das regras aprovadas pelas comunidades. A secretaria apoia a efetividade das normas consensuais de manejo da pesca comunitária. Os próximos passos são a sinalização dos territórios de pesca com placas e a definição das estratégias de monitoramento com a participação das comunidades”, declara Rodolpho Bastos.
A atuação conjunta com organizações parceiras, como a Sapopema, tem sido essencial para fornecer suporte técnico e facilitar a comunicação entre os pescadores e as autoridades.
“As comunidades pesqueiras têm um envolvimento direto em todas as etapas da construção dos acordos de pesca. Elas participam ativamente da elaboração desses acordos e demonstram grande interesse em acompanhar o processo após a homologação. Essas comunidades estão engajadas e comprometidas com o desenvolvimento das etapas pós-acordo, visando garantir a efetiva aplicação das regras estabelecidas. As comunidades se mobilizam para o processo de implementação e colaboram com o Estado para monitorar o cumprimento das novas regras, assegurando a proteção dos recursos pesqueiros e a sustentabilidade do ambiente em que vivem”, afirma Wandicleia Lopes.
A Sapopema atua com base em termo de referência assinado com o Governo do Estado para ajudar as comunidades na revisão dos acordos de pesca. “Nós acompanhamos desde as reuniões comunitárias para a construção desses acordos, apoiando eles nas fases de construção comunitária, de organização da minuta que deve ser encaminhada para Semas, de mapeamento da área do acordo, identificando cada lago existente nesta área.”
Desde 2002, uma equipe multidisciplinar da entidade desenvolve ações de acompanhamento às comunidades tradicionais e pescadores artesanais em 14 municípios do oeste paraense, contribuindo tecnicamente com ações de ordenamento. “O monitoramento é um processo da fase do pós-acordo em que nós contribuímos tecnicamente com o que os pescadores pensam, associando conhecimento técnico ao conhecimento tradicional. Esta fase é importante para garantir a eficácia das novas regras, homologadas pelo Estado”, completa Wandicleia Lopes.
“A pesca artesanal é fonte de alimento e renda para milhares de comunidades ribeirinhas do Pará. É a nossa bioeconomia azul ribeirinha. Garantir a sustentabilidade do modo de vida das comunidades pesqueiras é também garantir equilíbrio entre os diferentes usos de recursos naturais por comunidades na Amazônia. Se o pescador não tiver de onde tirar seu sustento, esse equilíbrio é inevitavelmente rompido. Não por acaso, onde há comunidades que vivem da pesca, é onde mais temos a floresta preservada”, conclui Rodolpho Zahluth Bastos.
Texto: Antônio Darwich – Ascom/Semas